Quinze anos de carreira (parte 3)
Na época em que murchavam as aventuras impressas da Casseta e do Planeta, comprei meu primeiro modem. Era praticamente o único modelo que funcionava no meu modelo de MSX e podia ser adquirido em loja. Comecei a acessar precariamente: o modem era tão lento que era barrado nos dois BBSs mais influentes. Não estavam errados, pois o modem "paraguaio" mais vagabundo para PC era oito vezes mais rápido que o meu; usuário de MSX passava tempo demais conectado, impedindo que outros acessassem, e pouco contribuía à comunidade. Mas havia dezenas de BBSs, quase todos amadores, que agüentavam a barra. Eu acessava uns nove ou dez alternadamente, mas só era usuário freqüente de três BBSs, no máximo.
Eu aproveitava um subconjunto das atrações do BBS: as salas de bate-papo, ocasionalmente (nada de muito impressionante: se fosse um BBS enorme, entravam cinco ou seis pessoas de cada vez, se tanto), e a troca de mensagens, sempre. O resto funcionava mal (jogos online, em interface de caracteres mesmo) ou não funcionava (acervo de programas, que todo BBS fornecia, mas poucos títulos rodavam em MSX). Foi aí que começou a cair a ficha da diferença entre padrão de mercado e otimismo otário: o retorno do meu investimento de informática seria tanto maior quanto mais gente usasse sistemas compatíveis com o meu. É a famosa lei de Metcalfe, inescapável, ignorada no Brasil em favor da fé no planejamento central e do orgulho de ser do contra. O uso de BBS foi determinante para que, em questão de meses, eu dispensasse o MSX em troca de um PC.
O sistema BBSiano de mensagens era melhor que o da Usenet ou das listas de discussão, onde todas as mensagens são públicas, ou do e-mail comum, onde todas são privadas: salvo indicação contrária, uma mensagem de Fulano para Sicrano poderia ser lida por todos que acessassem aquele board temático. Parece pouco, mas todo mundo podia meter o bedelho em qualquer discussão. Isso criava um sentido de comunidade fortíssimo, sem comparação no mundo dos contatinhos fugazes da Internet. Os BBSs, grandes e pequenos, se associavam em redes e trocavam mensagens entre si. Desse modo, qualquer mensagem podia ser ecoada no Brasil e (raramente) no exterior. Era um bocado de poder para um conglomerado de sistemas que a companhia telefônica fingia que não existia, sem visibilidade popular (o trabalho "evangélico" do Informática Etc. era das poucas exceções) e sem apoio do comércio não-muambeiro.
Mais divertidos ainda eram os encontros de usuários. Em meus primeiros dias de BBSiano, em 1992, quase todos eram realizados em bares ou restaurante entre Leme e Leblon, a região onde quase todos moravam. Só um pouco mais tarde é que ganharam força os encontros na Zona Norte e - pasmem! - em Niterói. Além dos encontros mensais regulares, inventava-se encontro por qualquer motivo, como se os eventos sociais fossem um lembrete permanente de como é fútil a vida online sem um pé no mundo real. Esse equilíbrio acabou abrindo novos caminhos para minha carreira... o que explicarei no próximo capítulo.
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