terça-feira, julho 17, 2007

Chega de blablablá! Um nulo intelectual foi vaiado por milhares de nulos intelectuais. Mas ninguém ficou sabendo.

E não é que a máquina de boatos e clichês da militância continua rodando a todo vapor? Vejo pessoas inteligentes caindo na armadilha do buzz lulista e repetindo bobagens sem saber por quê. Por exemplo:

O público devia mais respeito à figura do presidente. Em outras palavras, "tratem o pobre Lulinha com mais carinho; afinal, ele está por cima, você está por baixo, e um dia você pode precisar do carinho dele." Lula compareceu ao estádio para "fazer uma presença" como chefe de Estado: entrar mudo, dizer meia dúzia de palavras e sair calado. O problema é que Lula não pode trazer o chefe de Estado ao Maracanã e deixar em Brasília o chefe de governo, pois trata-se da mesma pessoa. Essa é uma falha do "DNA" do presidencialismo. Quer fazer boa figura diante da multidão? Não seja um administrador relapso.

O episódio queimou o filme do Brasil no exterior ("roupa suja se lava em casa"). Por motivos óbvios, os Jogos Pan-Americanos foram ignorados na Europa, na África, na Ásia e na Oceania. Estados Unidos e Canadá, ocupados com uma disputa de verdade -- os Jogos Olímpicos do ano que vem --, enviaram seus times B, não estão nem aí para os resultados e ainda conseguem manter razoavelmente elevado o nível da competição (valem as palavras de Oscar Schmidt em 1996: "Agradeço aos adversários, que tornaram nossa vida difícil"). A repercussão da vaia foi limitada (se tanto) aos países da América Latina e do Caribe, que estariam melhor se não fossem expostos a esses maus exemplos brasileiros e continuassem a tratar seus líderes com uma oposição silenciosa e comportada.

A vaia foi orquestrada. A teoria conspiratória diz que Cesar Maia foi o mentor da "manifestação" ou mandou executá-la seguindo ordens superiores. Essa bola de neve ainda vai crescer muito. De qualquer forma, a necessidade de puxadores de vaias parece plenamente contraditória com o item abaixo. E é.

Quem vaiou não foi o "povo", mas a "classe média". Escrevo "povo" e "classe média" entre aspas, pois ambas são abstrações demagógicas. É verdade que ainda havia muito "povo" nas arquibancadas da cerimônia, e o ensaio da abertura (no qual Lula tinha levado outra vaia) supostamente só tinha "povo". Mas tanto a esquerda quanto a direita compraram a idéia do uuuuuuuuuuuu como voz coletiva da classe média. Para uns, representa o desprezo da "elite branca" ao presidente que olha para os pobres. Para outros, a análise de quem comeu proteínas na infância, estuda, tem informação e forma uma idéia clara sobre o que está acontecendo. Por que isso é uma grande bobagem? A classe média carioca é formada pelos tipos mais desprezíveis que conheço. Apóiam a ocupação dos morros até o ponto em que suas trouxinhas e papelotes não faltem. Dão propina ao guarda e, no mesmo fôlego, se mostram filosoficamente contra dar esmolas. Protestam contra o turismo sexual mas acham que ser prostituta é motivo de orgulho. Não têm nenhuma pretensão intelectual que não seja a de passar em provas. E não têm nenhum pudor de defender um Estado totalitário, desde que nesse Estado "o meu" esteja garantido. Para um fiscal, o imposto de renda poderia ser de 99 por cento -- e lixem-se as vítimas. O mais marcante foi ouvi-los gritar "Ladrão! Ladrão!" Desconhecendo eles próprios qualquer norte moral, seqüestraram a moral dos outros (esta, sim, arraigada no "Brasil profundo") para julgar Lula por falta de cumprimento de nobres ideais que não existem. Amanhã votarão em Heloísa Helena. E depois será a vez de Heloísa Helena levar sua vaia. Aguardem.

2 comentários:

Cláudio disse...

Vi seu artigo no Diego Casagrande e tinha que vir aqui deixar meu comentário: se eu fosse escrever algo sobre a classe média, seria exatamente o que você escreveu, inclusive, melhor principalmente, com relação à parte da Heloísa Helena.

Abraços

Paulo C. Barreto disse...

Obrigado pela leitura! Poderia me estender sobre o etos da classe média neste artigo, mas não faltarão oportunidades. Continue de olho no blog.

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